sábado, 24 de março de 2012

Problemas com a adoção da senciência como critério moral de respeito à vida

Vegetarianos usam o padrão de senciência (capacidade de sentir) para argumentar que os animais, como os humanos, têm direitos.

Com isso eles pretendem evitar os problemas morais entre os próprios humanos (bebês e doentes mentais, por exemplo, que parecem ter pouco mais agência moral que animais) e fornecer uma moralidade de respeito à vida mais robusta.

Mas acho que há alguns problemas nessa tentativa. São apenas comentários esparsos, devo elaborar isso mais tarde:

1) Não há uma conexão lógica entre sentir ou não dor e o direito à vida

Não se segue que a vida de um ser tenha valor porque ele é capaz de sentir dor (ou mesmo que tenha capacidade de sentir prazer, etc). Não há nenhuma conexão lógica entre os dois fatos. Se, subitamente, um ser for sedado (digamos que não haja coação nessa sedação), ele perde a capacidade de sentir dor e portanto também o direito à vida?

2) A senciência parece conferir apenas alguns direitos, não outros

Bebês e doentes mentais claramente não são capazes de sobreviver sozinhos. No entanto, animais podem viver e de fato vivem sem auxílio humano. Mesmo assim, os defensores dos direitos dos animais não alegam que a senciência seja um bom parâmetro para defender que os animais tenham direito, digamos, a não ser animais de estimação.

Então a senciência serve para dar o direito à vida, mas não à liberdade dos animais. Isso fica ainda mais claro em casos como o da esterilização de cães e gatos, promovida por diversos vegans. Claramente os animais têm interesse no prazer sexual (pois são seres sentientes), mas são privados disso pelos interesses humanos.

Em resumo, a gente acaba em duas situações ruins: tirar direitos dos bebês e demais incapazes ou dar mais direitos aos animais, o que soa estranho.

3) A senciência não parece vindicar alguns dos direitos que nós achamos ser válidos

Parece difícil justificar a retaliação legal com base na senciência. Um criminoso não deixa de ser senciente porque assaltou alguém, e contudo deve ser punido. A base normal de direitos, que inclui a reciprocidade, resolve melhor esse ponto aparentemente incômodo.